Xadrez, um lance legal !!
Os aficionados por risco adoram movimentar precocemente sua peça mais valiosa, expondo-a ao perigo desde o início da partida. Tal audácia, que em muitos casos é penalizada, é tão atípica que, a variante escandinava, na qual a Dama avança ao centro do tabuleiro no segundo lance, raramente é vista em competições de alto nível. Por combinar os movimentos de torre e bispo em uma única peça, a Dama detém um raio de ação superior, o que justifica sua maior valoração. Seus movimentos deformam o tabuleiro, tal como um estrala gigante deforma o espaço tempo. Não é à toa que a Dama e a Torre são denominadas peças pesadas.
Já os cautelosos prezam acima de tudo a segurança do
Rei. É uma peça de mobilidade limitada, apesar de, assim como a Dama, poder
mover-se nas oito direções. Porém, enquanto a influência da Dama se estende por
longas distâncias, o Rei só pode controlar as casas ao seu redor. Por isso, no
início e meio do jogo, é crucial garantir sua segurança. Ainda que isso seja
válido para toda a partida, é no final do jogo que ele costuma ter uma
participação mais ativa, funcionando também como atacante, especialmente quando
o tabuleiro está menos congestionado.
Preservar
o par de bispos é um costume entre os mais experientes. Principalmente em
posições abertas, com menos peões bloqueando as interferências, as peças de
longo alcance (dama, torres e bispos) ganham maior influência. Os bispos se
movimentam diagonalmente e por isso cada um controla apenas casas de uma
cor específica, portanto, a perda de um deles pode criar um desequilíbrio em
relação ao complexo de cores do tabuleiro, sendo possível explorar estrategicamente.
Visualizar os movimentos possíveis para as Torres é bem fácil, basta imaginarmos uma cruz partindo dela até onde encontre um obstáculo ou a borda do tabuleiro. Inicialmente, elas estão posicionadas nas extremidades, a maior distância possível uma da outra. Apenas com o desenrolar do jogo e o deslocamento das peças que inicialmente estavam entre elas é que se torna possível a conexão direta. Geralmente através do roque, uma jogada especial que favorece a segurança do Rei enquanto ativa a Torre.
Embora sejam ocupantes naturais da última linha, as Torres frequentemente buscam lacunas nas linhas de peões inimigas, movendo-se lateralmente para lançar ataques à distância. Em situações mais raras, elas se arriscam em avanços audaciosos ainda no meio do jogo. Quando elas se conectam, é notável como a interação potencializa sua força, tornando cada uma mais poderosa do que quando operavam isoladamente. Assim, o dito popular, "A união faz a força", ganha novo sentido na experiência do jogo de xadrez, especialmente quando percebemos que ao dobrar as torres, ampliamos seu poder ofensivo e defensivo. Ganha-se espaço através do controle de casas e aumenta-se possibilidades de vitória, pois está mais seguro e melhor desenvolvido para atacar. Ainda assim, o roque é considerado um lance neutro, porque normalmente não vem com um ataque que obrigue o adversário à certas respostas.
Os
cavalos, com sua habilidade única de mover-se em um padrão em L, têm um valor
real menor comparado a maioria das outras peças. No entanto, sua capacidade de
surpreender com movimentos não lineares confere a eles um valor estratégico
distinto. Os jogadores que conseguem visualizar o padrão circular que o cavalo
cria, ao invés de pensar apenas nos movimentos em L, conseguem explorar todas as possibilidades para obter melhores resultados. Ao contrário dos
bispos, que ficam restritos a casas de uma única cor, os cavalos alternam entre
as casas brancas e pretas a cada movimento, exigindo maior atenção.
O campeão Wilhelm Steinitz disse certa vez: "Os peões são a alma do xadrez".
Dependendo da estrutura dos peões em cada partida a estratégia pode variar muito. Partidas mais abertas, onde muitos peões foram trocados favorecem peças de longo alcance, como os bispos, partidas fechadas favorecem manobras de cavalos. Como possuem um valor menor que das outras peças, por serem mais numerosos, controlarem menos casas e serem lentos, não há interesse do outro jogador trocar suas peças por peões, nem nossas peças pelos deles. É justamente essa dificuldade, que produz uma menor valoração, que paradoxalmente os tornam especiais. Desencorajando o avanço do oponente ser realizado sem ponderação, exigindo criatividade e estratégias para romper as barreiras que as cadeias de peões formam e os travamentos onde as cadeias se chocam, gerando as montanhas nos tabuleiros. Cada jogo tem seu relevo, pontos de estrangulamento e vazão dependendo de como uma membrana de peões colide com a do oponente serão a geografia com a qual as demais peças terão de operar, hora desviando, hora saltando, hora implodindo barreiras. (membrana porque são como uma pele protetora para o conjunto de peças mais valiosas, um escudo para o rei, se o conjunto de peças for tipo um transformer os peões são a casca dura do guerreiro, que lutará um combate corporal com seu oponente. Para alcançar o sucesso a melhor forma dependerá e será formada a cada lance)
A beleza estética dos sacrifícios de peças por peões talvez seja a característica que mais aguça a criatividade humana para explorar os caminhos mais difíceis de enxergar (porque inicialmente são prejuízos materiais, que revelam algo mais profundo sobre as demais interferências na posição.)
Em sua marcha lenta e restrita rumo ao outro lado do tabuleiro, com a obrigatoriedade de seguir sempre em frente rumo ao perigo, eles lembram a jornada do homem comum, ou soldado simples, onde apenas alguns conseguem sobreviver para se tornarem mais relevantes em determinado momento da história. Ao longo desse avanço, as estruturas criadas pelos peões ditam o ritmo e as estratégias do jogo. Ao chegarem ao fim da jornada tem o prazer do reconhecimento dos tempos gastos e espaços percorridos, em meio a tantos cruzamento de forças, pela promoção, podendo em um passe de mágica se transmutar para qualquer uma das outras peças, inclusive a mais poderosa.
Será que o segredo do jogo reside no tempo ou na organização espacial? Será que o
estilo tático, estratégico ou posicional é o preferível ou tudo é uma
questão apenas de graduação numa escala maior e o poder de adaptação a cada
circunstância é o que realmente importa? O próprio tabuleiro e sua forma, com
casas de duas cores intercaladas por todo terreno de batalha já permite viajar
num vazio cheio de opostos, tal qual é o espaço sideral.
Harmonizar
as peças de acordo com as situações de interferência apresentadas a cada tempo
parece o segredo do sucesso. Projetar o futuro e analisar as possibilidades
envolvidas escolhendo a cartada mais apropriada ao momento é metade do desafio,
resta ser constante. Mas, num universo tão complexo e cheio de alternativas é
injusto pinçar um aspecto como o preponderante. No Xadrez cada parte interfere
no todo, portanto, a cada lance, a relação direta entre cada uma das peças
sofre pequenas, quase imperceptíveis alterações. Há lances que imploram para
serem jogados, outros são raridades encontradas em momentos mágicos por uma
mente brilhante. A genialidade consiste justamente em detectar as mudanças
sutis a cada lance e utilizá-las no próximo, caso o companheiro não esteja
equivalentemente atento. Todos os comentários pontuais de analistas são frutos do desejo de expressar como é importante aquele entendimento
específico. Há um certo exagero necessário para realçar. Onde tudo está
interligado, tudo é importante.
Até os erros.
No
xadrez, até uma mente desatenta pode iluminar caminhos. O quanto não se aprende
com erros? Os normais, que induzem a revisão e alimentam o progresso e também
os sem querer. Tal como na evolução das espécies um ponto determinante para
mutação é o fato de se copiar errado, durante uma partida um mouse que
escorrega pode iluminar um caminho mais difícil de se pensar. A mente humana
cria certas armadilhas lógicas que impedem enxergar alguns lances e os erros os
trazem à tona. Apesar de divertido o jogo é tão difícil que entre os
enxadristas se diz que ganha o penúltimo a errar.
E quanto aos jogadores? Quando os introduzimos neste contexto percebemos a dificuldade da jornada. Depois de lidar com todas as complexidades do jogo, percebemos que do outro lado há um adversário com ambições similares movimentando um exército em sua direção. A cada tempo brancas e negras se alternarão em processo de expansão, ocupando com eficiência o espaço livre disponível a ambos visando a cada lance, ao mesmo tempo avançar, neutralizar as ações adversárias e mirar o rei adversário, protegendo o seu.
Trata-se de uma luta, e o conjunto das peças é o avatar de cada jogador. O quanto se esforça e o quanto pode se esforçar para ser melhor do que seu oponente? E melhor do que muitos? Todos Você poderia? A inteligência desempenha qual papel na velocidade da subida? Muito desconforto pode existir para os despreparados psicologicamente e com certeza existe uma dificuldade na avaliação que cada um faz de si em relação a dificuldade da escalada.
Xadrez
é considerado uma arte, um tipo especial de ciência, uma diversão, mas é
também uma disputa que se assemelha a uma guerra e talvez por isso deixe de ser
atrativo para muitos que não gostam da atmosfera de conflito, seja ela qual
for. Entre benefícios e malefícios, acredito que o saldo é positivo com sobras
significativas. Ajuda na concentração, na capacidade de ser cada vez mais
objetivo, na intuição, na visão espacial, na apreciação do belo, na aptidão
para elaborar planos e estratagemas, na capacidade de analisar compensações, na
diminuição da impulsividade, na rapidez de raciocínio, em aprender enxergar o
favorável de situações desfavoráveis e vice versa, na fortificação da memória,
na eficiência em harmonizar os elementos materiais a disposição com os
obstáculos a serem superados, na capacidade de avaliar o abstrato em relação ao
material, na aptidão de reconhecer a intenção e temperamentos alheios.
Sem mencionar ser um passatempo extraordinário. Outra, o tédio também requer
estratégias que esgotem a capacidade da mente de estar em outro lugar, quase
uma meditação por tanto. Diversão de sobra, apesar da tensão e adrenalina
geradas. Para os solitários crônicos ou momentâneos é, além de mais nada, um
grande presente, afinal o estudo do jogo pode gerar satisfação por si mesmo,
apesar da busca por uma companhia interessante para jogar, mesmo num ambiente
de disputa, possa ser saudável, atrativa e cada vez mais fácil de se
conseguir.
Quem observa um pouquinho mais detalhadamente esse mundo, enxerga no xadrez um retrato da maior de todas as guerras, a que provoca a existência em si. O contrabalanço das ideias de entropia e gravidade. A guerra entre luminoso e obscuro, vazio e cheio, movimento certo ou errado. O peso, o valor relativo das peças em sua dança pelo tabuleiro no decorrer de uma partida, assemelha-se a gravidade, que também se faz presente na habilidade do jogador manter a coesão dos elementos ao seu dispor. Já a tendência ao desarranjo, à desintegração, surge pela necessidade de aproveitar da melhor maneira o tempo para expandir e desenvolver as peças, aumentando as possibilidades no meio de jogo e provocando o eventual choque entre as forças opostas que tendem a aniquilação.
Assim, cada jogador ao desenvolver suas peças obriga o outro a ser o mais
preciso possível para que, ao mesmo tempo em que se organiza para atravessar o
portal adversário, o rei, desarmando as armadilhas colocadas em seu caminho,
possa também evitar o colapso de seu exército causado pela desorganização ou
corrosão de suas peças, ou queda do monarca.
Alguns não arriscam a aventura enxadrística por imaginarem ser algo excessivamente complexo ou um esporte destinado apenas a intelectuais, nerds ou mesmo idiotas que se achem mais inteligentes que o restante. Deixam algo precioso de lado sem nem ter o prazer de conhecer melhor. Esse preconceito somente é melhor do que não tentar por imaginar que o jogo seja algo entediante e chato. Precisamos respeitar quem não quer pela questão da agressividade e competição, afinal, Xadrez é de certa forma sobre conflito. Mas, se nem a própria existência ignora a necessidade de adaptação e complementação de opostos numa guerra contínua e majestosa que é travada desde o início dos tempos, por que faríamos nós ao nos divertirmos? É possível lutar saudavelmente e com elegância, assim como podemos treinar uma arte marcial e introduzir uma série de princípios que ajudem a viver melhor, inclusive instruindo a não violência, mas sendo capaz de se defender de um ataque injusto ou caçar, se necessário.
No xadrez
podemos pensar no adversário como um ajudante para desvendar certos caminhos
para os quais podemos estar desatentos. Na teoria evolutiva do jogo, certo
princípios emergem permitindo analogias para diversos aspectos da vida. Cada partida conta uma história. Alguns morrem por ganância, outros por precipitação, e os lerdos por hesitação. Os excessivamente meticulosos apertam muitos, mas tomam diretos de quem é mais objetivo. através da linguagem do xadrez qualidades humanas se chocam e se temperam.
Quem
dera em nosso país pudéssemos ter aulas nas escolas e que nossos jovens do
futuro falassem tanto em combinações envolvendo bispos e cavalos, quanto em
Ronaldinhos fazendo a diagonal nos gramados. É uma ideia a ser pensada, ainda
mais com a necessidade de que o ensino seja em tempo integral. Todos os
partidos falam dos milhões a serem gastos na educação, mas poucos apresentam os
"comos" da questão e meios inteligentes e fáceis para se alcançarem
os objetivos. Nessa necessidade de criação de posições respeitáveis de trabalho
do mundo atual por que não investirmos em colocar um professor dessa arte em
cada turno extra? Bom para os alunos que terão algo divertido e instrutivo para
formar um pensador e contrabalançar o excesso de livros e de horas nas salas de
aula, bom para quem tem a oportunidade de emprego e o prazer de se tornar o
professor dessa arte e, em última análise, bom para o país que estará dando um
passo importante no desenvolvimento da mente de nossos futuros reis e rainhas.
O
maior perigo no caminho de alguém iniciando essa jornada é a preocupação
excessiva em vencer a qualquer custo, na ilusão de que irá subir meteoricamente
e se tornar o número um e a frustração que pode surgir devido a isso em épocas
de estagnação da pontuação real atingida pela pessoa. A parada de crescimento
do rating, avaliação de desempenho de cada um, é um problema psicológico
que merece atenção em muitos casos. Principalmente para as crianças, que
algumas vezes são incentivadas pelos pais a mostrarem sua "mente
brilhante" como quem desfila uma roupa mais bonita do que a do coleguinha
para aparecer. Outro mal possível é derivado da ansiedade gerada em alguns, mas
isto também é uma questão de aprimorar o autodomínio, o que pode se reverter em
um bem.
Muitos
associam vários elementos da inteligência humana à habilidade no jogo, o que
não deixa de ser verdade, mas é preciso cuidado ao aferir a inteligência de
alguém ou a própria por este método. A diversidade humana faz com que seja
extremamente difícil catalogar os tipos de inteligências e o que é mais
benéfico possuir a cada tempo ou configuração de mundo. Quando há
estagnação num processo de desenvolvimento devemos procurar enumerar as
possíveis causas e estudar com tranquilidade qual a melhor maneira de superar o
obstáculo. O xadrez propicia um caminho longo cheio de avanços e estagnações
que permitem aguçar a criatividade, incentivar a disciplina, induzir a
perseverança e ampliar o conhecimento de princípios que podemos levar para a
vida.
O
enxadrista deve estar atento para avaliar se é tão interessante assim crescer
continuamente na pontuação e eternamente se comparar, até porque é natural que
quanto mais alto se suba, mais rarefeito fique o ar. Nem todos são alpinistas
de 7000 metros, mas uma pessoa com uma abordagem leve pode alcançar níveis de
diversão bem maiores do que os pressionados demais a ascender. Certo é que cada
um tem um limite, mas desconhecemos o próprio, então, certo cuidado em deixar
claro para si mesmo o que se quer nessa relação é extremamente importante.
Apenas um Kasparov ou Carlsen vai erguer a taça de melhor do mundo a cada
época. Existem oito bilhões de pessoas diferentes na terra; se formos nos
sentir mal porque outro é ainda melhor, então jamais alcançaremos e desfrutaremos
do nosso próprio sucesso. Ainda mais num esporte individual. Certas pressões
por desempenho só fazem sentido para quem se torna um profissional do jogo, e
mesmo assim com toda a atenção para não exagerar. Como um aspecto positivo
dessa mesma moeda, penso que todo psicanalista deveria recomendar xadrez para
os casos de narcisismo porque a dificuldade e a comparação induzirão a
reflexão, embora cada pequena vitória poderá causar tanta euforia que Narciso
certamente se achará “foda” de vez em quando.
Alguns
fazem o mais apropriado, querem simplesmente divertir jogando, estudando e
assistindo partidas que permitam absorver o que princípios dessa arte possam
trazer de benefícios para nós. Não é por covardia que deixam a disputa
ferrenha de lado e seguem até onde seja saudável e compatível com outros
interesses e atividades. Nem todos podem se dedicar para serem profissionais e
muitos poucos também possuem os requisitos necessários para se tornarem “o
rei”. Porém, para os humildes e os dispostos a adquirir cada vez mais
conhecimento, garanto que os encantos dessa experiência trarão inúmeros
benefícios e prazeres e permitirão, com esforço, estudo e tranqüilidade,
alcançar um ritmo de desenvolvimento gradual adequado que cause satisfação. Os
aspectos negativos podem ser controlados e eliminados na maioria dos casos. Na
educação física dos colégios temos aulas de futebol e nem todos têm a obrigação
de serem profissionais desse esporte. Inclusive, se essa ideia do xadrez nos
colégios fosse melhor desenvolvida no Brasil não deveria haver cobrança por
notas, aprovações ou rendimentos por causa dos males mencionados. Seria uma
diversão adicional para que os jovens estudantes não inspirem novamente
"Another Brick in the all". O fato de ser um jogo mental pode tornar
o jogo de xadrez uma cobrança potencial muito maior para o ser humano, que
frequentemente se sente orgulhoso em ser mais e mais racional, qualidade que
nos diferencia dos animais e de certa maneira, para alguns, entre os humanos.
Esse é realmente um grande perigo e por isso a necessidade de professores bem
instruídos, tanto tecnicamente, quanto psicologicamente.
A
internet aumentou consideravelmente o número de pessoas que entendem, jogam e
apreciam o Xadrez. Os motivos são vários. O primeiro deles são os vídeos de
partidas ou aulas que têm sido disseminados gratuitamente em ótimos canais no
Youtube, tais como o Chessnetwork, Agadmator, Matojelic, Gothamchess, entre
outros. Em português os melhores canais são: Gato Mexicano, Rafael Chess,
Xadrez Brasil, o canal do Rafael Leitão, GM Supi e o da Julia Alboredo. Não é
como na literatura, os vídeos para xadrez são muito mais rápidos e divertidos
dos que os livros com anotações que não permitem visualizar o que está sendo
dito ao mesmo tempo em que mostram o lance e apontam suas interferências, sem
mencionar a velocidade na qual se aprende. Outro fator importantíssimo é a
proliferação de sites destinados a essa prática, Lichess (gratuito e excelente)
e Chess.com, apenas para citar os mais populares. Como o desenvolvimento no
xadrez é bastante diferente para cada um, antigamente era bem mais difícil
encontrar alguém que fosse do mesmo nível para brincar. Isso envolvia
dificuldades de locomoção até um local próprio para a prática do jogo,
tempo de cada um para encontrar e ainda se deparar com o par perfeito em
capacidade técnica para um jogo equilibrado. Mas nestes sites esse problema não
existe, são muitos jogadores e a qualquer momento você encontra pessoas de
todos os níveis, inclusive vários próximos ao seu, o que permite a brincadeira
ser ainda melhor para os dois lados e o desenvolvimento ser gradual, com vitórias,
derrotas e empates se equilibrando na caminhada ascendente. Além de podermos
assistir a jogos de melhores ranqueados que estiverem ocorrendo no site naquele
momento aprimorando o aprendizado. Ou treinar exercícios táticos e conhecer
melhor as aberturas e os finais.
Como
é bom poder assistir um vídeo de xadrez, aprender algo sobre o jogo, divertir
com os comentários sobre a partida, conhecer mais sobre a localidade onde foi
disputada, ou aspectos relativos a um e outro jogador e à própria história
daquela partida em especial. É bacana poder perceber o estilo de Napoleão ou
Einstein, ou de tantos outros imortais nas partidas que deixaram registradas de
presente para nós. Seria tão legal se tivéssemos inúmeros locais para a pratica
do jogo no Brasil, tal como existem nos países de maior desenvolvimento humano
e cultural.
A
diversidade cultural também foi favorecida com a chegada e ampliação da
internet. Numa mesma sessão podemos brincar com pessoas de várias
nacionalidades. De vez em quando rola um bate papo e provocações divertidas nos
chats. E o nível de educação dos integrantes, a maior parte do tempo, é bem
agradável. É evidente que sempre existirá um ou outro mais bobo como em todo
lugar, mas é muito divertido saber que no giro que a terra da num dia,
interferências de cada jogador podem ser enviadas para tão longe em diferentes
lugares no globo e que durante uma brincadeira com desconhecidos, possamos
mexer com as emoções de tantos em diferentes localidades no planeta. Também
recebemos essas sensações e podemos observar o modo como várias pessoas reagem
ao nosso estilo ou a um determinado sistema enxadrístico e através da linguagem
universal do xadrez pescarmos idiossincrasias ao redor da Terra.
Participar dos chats antes, durante ou ao final de uma partida é outro
prazer que pode desembocar em uma amizade ou em um contato agradável e ameno
com um desconhecido sem ao menos sair do sofá.
As
mulheres participam cada vez mais dessa aventura. Em cinquenta anos passaram de
um por cento para serem 15% do total de jogadores. Já equilibram com os
melhores do sexo masculino em muitos jogos. Mas é evidente que para se comparar
com isenção, apesar desse tipo de análise ser controversa, visto que cada sexo
tem suas potencialidades e deficiências em campos distintos, teremos que
esperar até que o número de jogadoras esteja perto dos cinquenta por cento, o
que provavelmente acontecerá num futuro não tão distante. Mas inúmeros
destaques femininos já abrilhantaram a história do jogo e a presença das
mulheres nos salões e nas telas produz ambientes agradáveis e
democráticos.
A
evolução tecnológica tem feito uma revolução na história do jogo. Programas de
última geração têm evoluído rapidamente e nem os campeões mundiais são páreo
para eles hoje em dia. Há uma guerra de competição entre programas diferentes e
cada vez mais poderosos. O homem está sujeito a desatenções momentâneas, a
erros de cálculo, dificuldades de visualização e a inúmeras interferências que
a máquina não está. Além disso, os humanos se divertem ao preparar uma
armadilha para o erro do outro, numa espécie de disfarce da real intenção que é
desencadeada numa bela, surpreendente e mortífera combinação de elementos,
enquanto ao enfrentar uma máquina esse prazer é diminuído porque ela tende a
encontrar o caminho mais agudo dificultando nossa tarefa.
A
parte boa é que esses programas também têm descoberto muitos caminhos novos que
nem a genialidade humana alcançou e nos ensinado a depurar erro e reformular
princípios. Justamente por tentarmos fazer o mais lógico, o mais fácil para
manter a coordenação entre as peças ou o mais seguro. Nossa mente é
generalista. Evidente que 95 % do tempo este é o caminho acertado. Mas, é como
nas provas de concurso público, a exceção é que pega os candidatos e ajuda na
seleção. É também onde algum ensinamento novo pode surgir. Depois da base estar
consolidada e os princípios definidos é necessário aprimorar continuamente os
pormenores e saber onde exatamente se pode contrariá-los. O diferente é o que
chama a atenção do "cientista".
Todos os grandes campeões e suas equipes utilizam largamente o aparato tecnológico para procurar por novidades. É triste porque se perde um pouco do brilhantismo do homem em si superar, por outro lado é positivo já que permite avançar por horizontes que nem mesmo as mentes mais poderosas imaginariam. Lembra um pouco a era de ouro da astronomia amadora, onde uma das grandes peripécias era descobrir uma supernova ou algum astro ainda não identificado e atualmente isso fica bem mais raro já que temos telescópios no espaço varrendo cada centímetro da imensidão. Mas surgiram nesse meio tempo os astrônomos amadores que analisam dados dos grandes telescópios, dado a enorme quantidade de informação, e isso permite ao amador continuar a encontrar suas joias preciosas. No xadrez moderno aprendemos também com as máquinas e usamos cada vez melhor esse conhecimento um contra os outros. Isso torna tudo bem mais democrático. Hoje tudo está as claras para todos e com melhores esquemas de estudo em todos os níveis. Além disso, depois de cada partida podemos identificar visualmente onde exatamente erramos e nos corrigirmos para a próxima. Gráficos mostram em seus vales e picos, principalmente os mais acidentados os desníveis que aconteceram no jogo. As planícies e platôs indicam equilíbrio perfeito. Uma análise bem feita permite entender o porquê por trás dos lances e com a ajuda de experts que apresentam o melhor na internet o desenvolvimento se dá em outro patamar.
Depois
da primeira onda de programas computacionais que tentavam encontrar caminhos
viáveis ainda não navegados pela força de cálculo bruto, a inteligência
artificial entrou com toda força no ambiente enxadrístico e já o alterou para
sempre. Partidas onde juramos que a ideia não foi da máquina e sim do ser
humano pipocam maravilhando a todos com novíssimos caminhos e estratégias. O
equilíbrio ainda existe, até porque essa é uma qualidade intrínseca do jogo, já
está nas entrelinhas das regras e em todas as condicionantes envolvidas e as
máquinas não deixariam de estar vinculadas. Apesar de jogarem aparentes
maluquices de vez em quando, essas novidades tem iluminado novos caminhos e
desmistificado muitos preconceitos. Atualmente, principalmente depois da introdução
das AIs, o equilíbrio é alcançado num nível acima da nossa zona de conforto,
mas permitindo que todos nos adaptemos ao processo evolutivo da teoria do jogo.
Xadrez não é apenas um lance legal,
trata-se de um movimento humano transcendente ao tabuleiro!
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirAcho que já tinha lido um outro texto seu sobre o xadrez. Esse está ainda melhor. A questão escolar… primordial se realmente quiséssemos melhorar o ensino. Duro ver crianças saindo do ensino básico sem saber ler ou fazer contas. Sobre AI o tópico é infinito. Xadrez para o povo!!! Será que Você seria eleito?
ExcluirSim enviei esse no grupo há algum tempo, mas dei uma trabalhada nele para adaptar a evolução do mundo enxadrístico. Educação é a melhor forma de transformarmos esse país com segurança para um futuro estável. Ações como essas custam pouco e geram bons resultados.
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