Os benefícios da leitura!

 

             
                     

Talvez o simples fato de ser extremamente divertido já justificasse o gosto pela leitura. No entanto, sabemos que nem sempre as pessoas são educadas adequadamente para adquirir esse hábito, e que existem outras formas atrativas de alcançar conhecimento no mundo atual competindo quase deslealmente com o prazer de saborear um livro. Quanto mais a tecnologia se desenvolve, mais curtos, diretos e personalizados se tornam os conteúdos. Isso talvez impeça ao homem sua única chance de, mesmo sem asas, voar. Se já falta paciência para assistir a um vídeo mais longo, imaginem o desafio que representa ler um livro. Como a imaginação pode ter tempo para despertar e desenvolver, se estamos sempre absorvendo? Sem tempo para digerir, mastigando bem antes. Ruminando. Apenas uma criatividade reativa aos estímulos é gerada e propagada em retorno. Se continuarmos assim, estaremos sempre reciclando ideias antigas e jamais gerando algo novo e autêntico.  

Um dos aspectos mais fascinantes da leitura é a capacidade de, por alguns minutos ou horas, nos transportar para outra dimensão. Durante esse processo, o ritmo natural da leitura promove a quietude necessária ao prazer e amplia a nossa capacidade de percepção. Estudos apontam que ler pode reduzir os níveis de cortisol tão rapidamente quanto ouvir música ou caminhar. 

                                 

Inúmeras vezes, em épocas de ansiedade, recorri aos livros como remédio. Lembro-me especialmente de uma ocasião, durante uma febre amorosa, em que apenas a literatura conseguia distrair meus pensamentos persistentes. No início, era difícil conectar-me, mas uma vez mergulhado na história, algo mágico acontecia. Curiosamente, encontrei no próprio enredo estratégias valiosas para reconhecer e enfrentar as armadilhas do ciúme e dos pensamentos obsessivos sobre alguém. 

                             

É fácil perceber como surge um aumento significativo da inteligência emocional, especialmente quando embarcamos em romances, biografias e textos psicológicos, que nos treinam para compreender melhor as emoções. Ao ampliarmos nossa compreensão das experiências alheias, fortalecemos nossa empatia, melhorando assim nossas relações e expandindo nosso universo social a pessoas com as quais talvez antes não suportássemos conviver e alcançando outras que talvez não apreciassem tanto nossa companhia. Muitos livros, aliás, atuam como espelhos simbólicos, despertando reconhecimentos, questionamentos e revelações, tornando-nos mais perspicazes e ampliando nosso potencial de influenciar positivamente o mundo.

Se a leitura fortalece relações, também ampara os solitários. Durante a leitura, sentimos a presença dos narradores, autores e personagens, sentimo-nos acompanhados por suas vozes, mentes e universos distintos. Quantos idosos, com tempo livre em excesso e vivendo grande parte do dia sozinhos, poderiam preencher seus momentos com essa rica e silenciosa companhia? O cérebro fervilha, renova-se e mantém-se saudável. Estudos recentes sugerem inclusive que, para prevenir doenças degenerativas como o Alzheimer, o hábito regular de leitura pode ser extremamente eficaz.

 https://www.bbc.com/portuguese/articles/cgr2e092x2po

 Ler é um gesto solitário, mas nos reconecta profundamente com nossa vida interior, convidando à contemplação, elevando a consciência e ligando-nos a algo maior—seja a natureza, o tempo, a humanidade ou o próprio mistério da existência.

Quem lê vive milhares de vidas em uma só, acumulando experiências não apenas pessoais, mas aquelas de todos os personagens que conhece pelo caminho. Essa talvez seja uma das maravilhas mais impressionantes da leitura: ampliar nossas vivências sem precisar sair do lugar. Ela transcende bolhas culturais, ideológicas e temporais, amplia nosso vocabulário, refina nossa linguagem e aprimora a clareza do pensamento por meio das vozes únicas de inúmeros escritores. Conviver com ideias contraditórias e personagens complexos educa-nos a aceitar o outro e reconhecer a imperfeição humana. O confronto com dilemas morais encontrados em narrativas literárias também afina nosso julgamento ético, aprimorando a clareza de expressão, argumentação e escuta. Grandes obras, com sua beleza estética e linguagem poética, oferecem consolo existencial, tateando o indizível e ajudando a compreender até mesmo o absurdo da vida.

Além de tudo isso, ler é também um ato de emancipação. Quem lê com frequência adquire ferramentas para pensar por conta própria, questionar discursos prontos e resistir à manipulação — seja ela política, midiática ou emocional. A leitura ensina a interpretar o mundo e não apenas reagir a ele. Em tempos de desinformação e opiniões fáceis demais, livros exigem pausa, contexto e raciocínio. 

Preciso, no entanto, fazer uma confissão. Durante muitos anos, usei a leitura apenas como ferramenta prática de aprendizado: lia textos acadêmicos e estudava apenas por resumos. Admito que meu hedonismo continha um exagero prejudicial. Um grande amigo costumava rir quando eu dizia que não precisava ler, pois me cercava de pessoas interessantes e já aprendia o suficiente por "osmose" nas interações. Evidentemente, hoje percebo o erro e até o egoísmo nessa postura. Eu poderia absorver algo dos outros, mas o que tinha a oferecer ficava limitado por não me permitir a profunda ampliação intelectual proporcionada pelos livros. Além disso, o que eu ganhava desprezava os inúmeros benefícios mencionados até aqui e outros tantos ainda por descobrir.

Um deles é justamente enriquecer o contato humano. Conversas sobre livros criam laços especiais, como descobri recentemente ao participar de um clube de leitura. Esse clube me permite alcançar entendimentos e insights que sozinho não teria. É um prazer imenso discutir obras empolgantes e criticar aquelas que deixam a desejar, tudo com argumentação mais elaborada e consciente. Refletir para expressar-se sobre as obras escolhidas é, por si só, um grande aprendizado. Durante esses debates, cria-se uma espécie de egrégora, uma sintonia especial onde três ou mais participantes descobrem recantos ocultos na obra e em si mesmos. Boa companhia, cerveja e petiscos, em um ambiente favorável à conversa sobre arte, só pode ser muito gostoso!!!

                             

 Fiz aqui minha mea-culpa pelo descaso com a leitura na adolescência e juventude. Apenas por sorte — nos arranjos e desarranjos da vida — consegui, já na vida adulta, recomeçar o que poderia ter me transformado muito antes. Percebo que o desafio é ainda maior para os jovens de hoje, dada a variedade esmagadora de estímulos disponíveis. Por isso, introduzir o gosto pela leitura precisa ser planejado com inteligência e delicadeza, permitindo que ele ganhe impulso e encontre espaço real na vida de cada um.

A leitura escolar, especialmente no Brasil, ainda padece da velha imposição autoritária dos clássicos. Não é surpresa que adolescentes encarem Machado de Assis ou Guimarães Rosa com o entusiasmo reservado às visitas ao dentista. A escola erra não por apresentar grandes obras, mas por tentar empurrá-las goela abaixo numa fase da vida em que a rebeldia é mais frequente e sedutora que a sabedoria. Talvez devêssemos inverter a lógica e, quem sabe, proibir os clássicos aos jovens — o gosto pelo proibido costuma ser um tempero irresistível. Um pouco de psicologia infantil não faria mal. 

Cada livro pede seu tempo e seu ritmo. Assim como não entregamos as chaves de um carro a um menino de doze anos, por que oferecer a ele as ironias de Memórias Póstumas de Brás Cubas? Deixemos que os jovens amadureçam primeiro. O que aconteceu com o equivalente ao patins, o skate e a bicicleta?  Comecemos com crônicas, contos, romances mais leves, que despertem o prazer e a identificação — para que o primeiro encontro com a literatura não seja traumático, mas sedutor. Talvez até uma pesquisa sobre os interesses pessoais de cada aluno, com indicação personalizada deva ser pensado para fisgar os peixinhos. 

O sucesso de escritoras como Paula Pimenta mostra que, motivados por histórias envolventes e compatíveis com a maturidade de cada fase, os jovens podem, sim, tornar-se leitores entusiasmados e prontos para os passos seguintes. Por outro lado, O Lobo da Estepe pode ser muito melhor apreciado por quem já passou dos quarenta e começa a notar tudo enrijecer lentamente, inclusive nossa vontade de variar, de experimentar, de se dar a chance de...

Alongamento, caminhada e exercícios para os músculos; para a mente, leitura e interação social: talvez essa seja uma boa receita para que nosso enrijecimento e conservadorismo natural do tempo não se transformem em sua versão mais radical. 

"Por isso cuidado meu bem; Há perigo na esquina"

Espero que esse ensaio seja capaz de convencer e incentivar, e possa se tornar  alerta para uns e resgate para outros. 

E lembrem-se, não deixem de ler, pois a ler-deza pode se instalar.


Comentários

  1. Beleza de texto! Show de bola

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  2. Sempre maravilhoso seus textos

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  3. O problema do convite à leitura no texto, é que quem não possui tal hábito, não irá ler o blog. 😂
    Li meu primeiro livro com 20 anos, muito pela falta de incentivo das escolas e família. Contudo, nunca é tarde! Desde então nunca mais parei.

    Abraços do amigo que jamais esquecerá seu call de A4.

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  4. Obrigado Manu, Mateus e ao anônimo do show de bola!!!

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  5. Mateus, seu comentário ressoa bem com o texto, obrigado pelas leituras e feedback.

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